Reportagem
de Anatolian Menigeni
Na
manhã de 22 de agosto, o sol devolvia para a atmosfera o orvalho que a noite
deixou. Umedecendo, neste trajeto, as frágeis narinas da senhora Cacilda
D’acapulco. Uma tímida anciã que, aos 71 anos, saiu de casa para cultuar a
morte do filho.
Assim,
dando vazão às suas raízes mexicanas em um rito racionalizado em três etapas:
A
– No fato de se tratar de um dia dedicado a Nossa Senhora Rainha.
B
– Porque, quando em vida, obviamente, o cidadão se tornara um sectário da
doutrina evangélica e, numa contestável demonstração de fé, esmigalhou uma
imagem da Santa, que Dona Cacilda conservava em um misto de altar com estante,
na edícula de sua residência.
C
– E, porque, segundo ela, ele teve um fim não tão díspar, ao ser atropelado por
um ônibus, na Avenida Tico Terpins.
Assim,
de ano em ano, no aniversário do seu falecimento, ela vai ao Cemitério
Municipal de Arcádia Paulista com um caquinho da escultura em mão e o deposita
sobre o jazigo do filho. A fim de que ele restaure a estátua e se redima da
falta cometida.
Como
de costume, a decrépita Dona Cacilda alcançou a sepultura de Cantinflas
D’acapulco – que, se vivo, teria 33 anos –, sacou da bolsa a escova e limpou-a
dos resíduos do tempo. Ficando feliz por não ter encontrado o décimo segundo
fragmento que lá deixara. Pois sabia que, daqui a vinte e nove anos, no reino
dos céus recebido ele seria. E, por isso, a nova lasca lá largou. Juntou as
mãos e orou; pedindo para que La Santa – uma entidade mexicana –, junto a Nossa
Senhora Rainha, intercedesse em favor do morto. Depois, chorou, tirou os
grossos óculos, limpou-se das lágrimas e os colocou de volta. Então, em tom de
súplica, olhou para a grande cruz, que, numa alusão ao Monte das Oliveiras,
ficava sobre o jazigo, e quase teve um enfarte.
Dado
que calçada à mesma havia uma cabeça.
E,
enquanto a senhorinha era acudida por uma adolescente, que tinha ido até lá
para testar a câmera lambe-lambe que herdara do avô, o zelador chamou a
polícia.
Que,
sob o comando do Delegado Antônio das Flores (o popular Totonho Três Oitão),
optou por, inicialmente, recompor o corpo.
Retirando,
para isso, a cabeça da cruz.
Uma
cabeça de mulher e que não continha uma só gota de sangue. E que, embora
tivesse ferimentos estranhos na região do pescoço, fora decapitada com algum
instrumento cortante.
Além
de ter a boca abarrotada de dentes de alho.
Quando
ao corpo, este foi encontrado sobre outro túmulo.
Nu,
petrificado – em função de uma rigidez cadavérica – e, também, sem um rastro de
sangue. E, como se fora o de uma pin-up macabra, disposto de modo em que ficava
sentado, com uma perna cruzada sobre a outra e as mãos, graciosamente,
colocadas sobre o joelho.
Sem
falar da estaca que lhe atravessava o peito.
Uma
estaca que, como se apurou, era um símbolo da presença de espírito do agressor.
Já que, como um percevejo, a mantinha em tal posição, ao ter a sua ponta
afixada em uma falha da cabeceira da sepultura.
Porém,
não foi só um pau que a atravessou. Pois, devido às marcas que ela tinha pelo
corpo, se deduziu que estuprada fora.
Todavia,
a vítima se chamava Beatriz Peterson e tinha 23 anos. E foi identificada,
inicialmente, como sendo B. P., de 16 anos. Que é a sua irmã caçula. A qual, na
véspera, saíra para ir a um evento em memória de Raul Seixas, na Praça Francis
Bacon, e não regressou a tempo de evitar que sua mãe notificasse seu sumiço à
polícia.
Do
alto dos seus 49 anos, Bárbara Peterson disse que jamais esperou encontrar sua
filha mais velha na mesa do legista. Pois sempre acreditou que ela tivesse a
cabeça no lugar.
Contudo,
voltando ao tempo do crime: embora o vigia noturno negue tê-la visto ou ouvido
algo que não fosse o silêncio, a câmera de segurança de uma floricultura a
captou, através das grades que protegiam sua porta de vidro, falando sozinha,
por minutos, e, posteriormente, se dirigindo em direção ao seu destino.
Ao
que tudo indica, ela invadiu o local, por algum ponto ainda desconhecido, e foi
atacada por um maníaco.
O
que deixou algumas questões em aberto:
A
– Se existe algum assassino que atua em parques fúnebres, e coexistem mulheres
que perambulam pelo mesmo território, o que fazer para que tanto o cemitério de
Arcádia como os de toda região do Vale do Ribeira não constem em algum guia
turístico de crimes estranhos?
B
– Se acontecia um evento com potencial para atrair turistas e, embora em acordo
com as bizarrices que se aglutinam nos anais da polícia, o crime seja inédito,
ele não seria obra de um forasteiro?
C
– Se todo caçador tem um amor (ou o que o valha) pela caça, e a mesma deva
corresponder a essa expectativa, Beatriz Peterson teria sido um alvo padrão?
D
– Se o cemitério é um espaço sagrado, e o crime é uma afronta ao que é sacro,
dentro da cultura cristã, poderia não se tratar de um delito e, sim, de um ato
sacrifical pagão?
E
– Se se trata da obra de um narcisista, e a mídia é o seu espelho, por que a
polícia não se alia à imprensa nesta empresa?
Até
o fechamento desta edição, as autoridades competentes não deram resposta.
Vampyres - As Filhas de Drácula
Um filme de José Ramón Larraz
(Inglaterra / 1974)
Todavia, há um ditado que afirma o seguinte: "a boa mulher é aquela que perdeu a virgindade e manteve a classe". Contudo, como é possível manter a "classe" se se cultua o axioma que prega que "o aspecto proveitoso da fidelidade é que ela comprova o quão prazerosa é a promiscuidade"?
Simples: criando uma sociedade paralela. Em que a distorção social transforma a fraqueza em virtude.
Assim, um grupo de misses embarcou em uma cruzada contra a real razão de seu fracasso: a competência alheia. E se deparou com o sucesso da incompetência: ou seja, o acaso.
Simples: criando uma sociedade paralela. Em que a distorção social transforma a fraqueza em virtude.
Assim, um grupo de misses embarcou em uma cruzada contra a real razão de seu fracasso: a competência alheia. E se deparou com o sucesso da incompetência: ou seja, o acaso.
A Quadrilha das Misses Assassinas*
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